Participei do primeiro Festival Brasileiro de Bridge On-line em condição muito especial, não apenas como jogador, mas também como organizador. Desde que assumi a presidência da Federação Brasileira de Bridge, em janeiro deste ano, foi a primeira experiência de planejar e executar um torneio com essa dimensão, começando pelo ineditismo da competição virtual. Para minha sorte, estou cercado de pessoas competentes, dedicadas e muito bem preparadas. Devo a elas o sucesso absoluto do evento.
Foram vinte equipes e aproximadamente cento e vinte jogadores espalhados pelo Brasil, além de vários participantes estrangeiros. A disputa remota, por exemplo, abriu espaço para uma equipe completa de Portugal; times que reuniam brasileiros, uruguaios, bolivianos, chilenos e argentinos; turcos e latino-americanos vivendo na Europa, com partidas comentadas por um carioca que mora nos Estados Unidos, assessorado por um boliviano. Incrível!
As relações digitais estão conectando com mais facilidade amantes do mesmo hobby, independente da sua localização geográfica. No caso do Bridge, o afastamento presencial tem sido compensado pelos torneios virtuais, os quais têm proporcionado alguma diversão para os adeptos, sobretudo durante esse período de confinamento.
Como se pode deduzir pelo título do artigo, minha equipe, composta por seis jogadores, conquistou o sétimo lugar na competição. No time, como parceiro de dupla, joguei com meu filho Henrique (19 anos), atualmente um dos destaques da América do Sul na categoria juvenil, que no bridge, curiosamente, vai até 25 anos. Já conquistamos, juntos, duas medalhas de prata em torneios nacionais, o que é motivo de grande orgulho. De fato, uma alegria especial dividir uma das minhas atividades prediletas com ele.
A decisão ocorreu em três tempos, contra uma equipe mais forte, posicionada entre as favoritas do torneio, mas que não se desempenhou em sua plenitude nas fases finais. Ganhamos por muito pouco e eu comemorei! Fiquei realmente feliz com a vitória. Escrevo isso porque, de alguma forma, nossa cultura não dá valor para as posições fora do pódio. Na verdade, apenas o primeiro lugar é valorizado. Mesmo no futebol, paixão nacional, os torcedores raramente lembram ou festejam o segundo ou terceiro lugar. Podem até comemorar a obtenção de uma vaga em torneios internacionais, mas não a posição em si.
Esse comportamento é extremamente inadequado e faz muito mal para o Brasil enquanto Nação. Lembro-me muito bem de uma apresentação de um representante português, em certa ocasião, que anunciava com entusiasmo marcos mundiais do seu país. Era 17º em um setor, 35º em outro, 26º em um quesito qualquer. Falava de boca cheia, como nós falamos dos títulos de campeão. Tinha um verdadeiro orgulho daquela posição intermediária.
Em 2019, por três vezes, estive em Portugal. A primeira, acompanhando meu sobrinho Cauê (gravem esse nome!) durante um treinamento de duas semanas no Benfica. Encantando com o que vi, retornei duas vezes e inaugurei um escritório comercial em Lisboa. Talvez mais do que nós, sofreram com a crise financeira do começo do século, no entanto se recuperaram e estavam vivendo um momento de pujança até a crise do coronavírus. Tenho certeza de que em breve vão se reerguer novamente. Uma das razões da resiliência lusitana foi confidenciada por uma nativa, a consultora empresarial Olga Ribeiro, que nos assessorou na abertura do escritório. Disse-me que no decorrer da crise conseguiram uma mudança cultural incrível, passaram a valorizar os produtos de origem portuguesa. Quando iam ao mercado e tinham opções entre importados e nacionais, não tinham dúvida, prestigiavam o produtor local. A comoção foi tamanha que, inconscientemente, passaram a desvalorizar a qualidade dos produtos importados, isso sem qualquer relação real com a qualidade verdadeira do bem.
Acredito que devemos extrair uma lição importante desse exemplo de patriotismo dos nossos descobridores. Ao valorizar o produto nacional, os portugueses conseguiram reerguer sua economia e sua autoestima. Em poucos anos, saíram de um momento desafiador para uma sociedade de prosperidade. Lisboa, cidade linda, tem um nível de segurança, transporte público, educação e saúde que tem atraído milhares de brasileiros para constituir residência por lá.
O Brasil enfrenta problemas estruturais de toda ordem que merecem constante atenção e dedicação. Seria um erro, porém, desmerecer ou omitir os atributos de competitividade que fazem de nós uma verdadeira potência mundial. É preciso reconhecer, valorizar e celebrar nossas virtudes, prestigiar o que temos e produzimos aqui. Alguns dados traduzem bem essa visão:
- Dimensão Econômico
- 9ª maior economia mundial, com PIB de US$ 1.87 trilhões (FMI);
- 9° principal destino de investimentos internacionais em 2019: US$ 72 bilhões – 5% do total (UNCTAD);
- Principal destino de investimentos internacionais na América Latina em 2019 – 43% do total (UNCTAD);
- 7ª maior população mundial, o que torna o país um dos mercados internos mais relevantes e atrativos do globo (U.S Census Bureau).
- Dimensão Energética
- 10° maior produtor mundial de petróleo e maior da América Latina (BM);
- 2° maior produtor mundial de etanol, respondendo por 30% do volume global produzido em 2019 (USDE);
- 2° maior produtor global de minério de ferro, com 19% da produção mundial (DNPM);
- Atualmente, 80% de toda matriz energética do país têm origem em fontes renováveis, volume superior à média de todos os países da OCDE – 23,8% (OCDE).
- Tecnologia e Inovação
- 7° maior produtor mundial de TIC, alcançando, em 2019, US$ 90 bilhões (IDC);
- O setor de TIC representa 6,8% do PIB brasileiro (IDC);
- O mercado brasileiro de TIC representa 43% do total da América Latina (IDC);
- 5º maior mercado de telecomunicações do mundo, com 315 milhões de acessos à internet, sendo 280 milhões de conexões móveis e 35 milhões de acessos em banda larga fixa (Telebrasil);
- Atualmente, 13.083 startups estão instaladas no Brasil (ABStartup);
- Com cerca de 2.700 empresas de base tecnológica, a cidade de São Paulo está entre os 30 maiores ecossistemas globais de startups, ao lado de grandes centros, como Berlim, Tóquio, Jerusalém, entre outros (Global Startup Ecosystem Ranking 2020).
- Recursos Naturais
- O Brasil possui extensas áreas de vegetação nativa, que cobrem cerca de 66% do território nacional, e são reconhecidas mundialmente por sua importância para a biodiversidade, a ciclagem da água, o armazenamento de carbono e a regulação do clima (MMA);
- O Brasil dispõe da maior reserva global de água doce do mundo, com 6.950 quilômetros cúbicos, suficiente para encher 2,78 bilhões de piscinas olímpicas (UNESCO).
- 70% das reversas do país estão concentradas na Amazônia, onde o Rio Amazonas e seus afluentes correspondem a 1/5 de toda água do mundo (UNESCO).
- Agronegócio
- O agronegócio responde por mais de 21% do PIB brasileiro (CNA);
- A produção agrícola vegetal ocupa menos de 10% da área cultivável do país, enquanto a agropecuária demanda entre 20% e 30% da área disponível (FAO);
- Em 2019, a produção agropecuária brasileira foi de R$ 674,8 bilhões (MAPA);
- O Brasil é o 2° maior produtor mundial de alimentos, atrás apenas dos Estados Unidos (FAO);
- O país é o 3° maior exportador mundial de alimentos (FAO);
- Alguns destaques:
- 1° produtor mundial de suco de laranja / 1° exportador mundial (USDA);
- 1° produtor mundial de café / 1° exportador mundial (USDA);
- 2° maior produtor mundial de soja / 1° exportador mundial (USDA);
- 1° produtor mundial de açúcar / 1° exportador mundial (USDA);
- 2° maior produtor mundial de carne bovina / 2° exportador mundial (USDA);
- 2° maior produtor mundial de frango / 1° exportador mundial (USDA);
- 3° maior produtor mundial de milho / 2° exportador mundial (USDA);
- 4° maior produtor mundial de carne suína / 4° exportador mundial (USDA).
Somos uma potência mundial, vamos colocar de lado o “complexo de vira-lata”, reconhecer e comemorar os nossos pontos positivos. O momento é de mudanças, vamos aproveitar para alterar nossa cultura, prestigiar o que temos de bom e erguer o Brasil para os patamares que merecemos.
*Jeovani Salomão é empresário do setor de TICs e ex-presidente do Sinfor e da Assespro Nacional.